terça-feira, 19 de junho de 2012

CASA CANADÁ


Mena Fiala e Cândida Gluzman
As irmãs que impulsionaram a Casa Canadá e a moda brasileira
Por Crib Tanaka *
Foto Eduardo Teixeira

Rio de Janeiro, década de cinquenta: aparecimento da televisão no Brasil, da bossa-nova, das atrizes do rebolado, da moda influenciada pelos musicais da Metro, glamour traduzido em reuniões na Confeitaria Colombo, nos vestidos acompanhados de luvas e chapéus, nas lojas de moda localizadas no Centro da cidade. Nesse cenário, despontava a Casa Canadá.

Mena Fiala, Cândida Gluzman e Casa Canadá

Mena Fiala, descendente de italianos, nasceu em Petrópolis, onde aprendeu com as irmãs Falconi a arte de fazer chapéus. Por volta de 1929, mudou-se para o Rio de Janeiro e conheceu Jacob Feliks, fundador da Casa Canadá, com quem passou a colaborar.
A Casa Canadá funcionou na Rua Gonçalves Dias até 1934. Quando houve a inauguração da sua grande loja, na Rua Sete de Setembro, Mena e Cândida foram convidadas para dirigir a seção de roupas por atacado. Cândida ia cinco vezes por ano a Paris e trazia modelos de estilistas como Balenciaga, Dior e Jacques Faith.
“Elas desmontavam as peças que vinham de fora e estudavam, buscando entender a modelagem, como aquela peça era feita” – explica Cristina Seixas, estilista e jornalista, que desenvolveu uma tese sobre a Casa Canadá. Criando e interpretando com base na inspiração dos modelos europeus, impulsionaram a implantação e o desenvolvimento da indústria do vestuário.
Canadá de Luxe
A procura era crescente e a importação tornava-se complicada. Para atender às clientes, foi aberta, em 1944, a Canadá de Luxe, a primeira grande casa de alta costura do Brasil. No dia 17 de julho do mesmo ano, acontecia o primeiro desfile com manequins, treinadas pelas irmãs. Inaugurava-se a tradição dos desfiles de moda como apresentação de tendências à imprensa e ao público consumidor. Mena e Cândida também foram responsáveis pelo primeiro prêt-à-porter do país.
“A Canadá sempre foi uma loja destinada às grandes fortunas. Os clientes podiam passar uma tarde inteira na Canadá. Você podia entrar e pedir para que lhe passassem uma pele, um vestido, haviam modelos fixas que ficavam o dia inteiro à disposição. Enquanto você assistia ao desfile, tomava um café, um chá; tudo sem a obrigação de comprar, é claro.” – conta Lucianita de Carvalho, filha de Mena Fiala.
A cada estação que iniciava, um novo desfile. Cronistas como Elsie Lessa, Malu Ouro e Ibrahim Sued e personalidades como Juscelino Kubitschek, Eva Monteiro de Carvalho e Lourdes Catão formavam a platéia. Vânia Pinto (Miss Brasil e artista de cinema nacional) e Adalgisa Colombo (Miss Brasil) eram duas das muitas modelos da Casa Canadá.

O auge e o reconhecimento no exterior

Na década de cinqüenta a Canadá teve seu auge. O destaque da Canadá era os vestidos de noiva feitos de tecidos finos, ricamente bordados com ouro, prata e pedrarias e trabalhado com rendas criadas pelas próprias irmãs. Havia fila para comprar cada um dos modelos exclusivos apresentados nas coleções. “A alta sociedade vestia-se pela Canadá. Vinha gente de todo o Brasil encomendar vestidos”, diz Lucianita.
Darcy Vargas, Santinha Dutra, Sarah Kubitschek e Dulce Figueiredo foram algumas das clientes responsáveis pelo reconhecimento da Canadá e, conseqüentemente, da moda brasileira, no exterior. Mena criava roupas que eram desfiladas, por elas, pelos corredores do Palácio do Itamaraty, em embaixadas, Brasília e em encontros políticos realizados em outros países.
A Casa Canadá fecha as portas
Em 1967, o prédio onde funcionava a Canadá foi desapropriado e a loja fechou as portas. Mena e Cândida continuaram dirigindo desfiles até 1972.
Em 25 de maio de 1977, quando completavam cinqüenta anos de carreira, realizaram um desfile apresentando sessenta criações, no Hotel Sheraton, em benefício da Obra O Sol. Na platéia, as clientes, as damas da alta sociedade e a imprensa.
No dia seguinte, lia-se em uma nota de Ibrahim Sued, no jornal O Globo: “Verdadeiramente emocionante a volta das criações de Dona Mena e Dona Cândida, exibidas nos salões do Sheraton, em tarde de muita elegância, tanto na platéia quanto as passarelas.”
Curiosidade sobre o estilista Denner
Muitos associam o estilista Denner à Casa Canadá, uma vez que muitas vezes contou ter aprendido muito com Mena Fiala. Porém, a verdade é que o estilista nunca trabalhou na Casa Canadá. “Ele contava uma história fantástica, dizia que estava num trem, seus desenhos caíram no chão e uma senhora teria ficado impressionada como talento dele....e parece, não sei muito bem, que através dela, ele teria sido apresentado a minha mãe, que imediatamente o teria contratado. Mas, isso nunca aconteceu. Minha mãe ouvia e lia os depoimentos dele dizendo que havia trabalhado na Casa Canadá, mas nunca desmentia, porque aquilo não a prejudicava de nenhuma maneira e acho que ela sabia que isso fazia bem a ele. Ele sempre teve loucura por mamãe por causa disso, acredito. Um dia, uma moça, que estava fazendo a biografia do Denner, ligou aqui para casa, querendo entrevistar mamãe, querendo saber mais sobre a relação dele com a Canadá. Quando ela chegou aqui, mamãe disse que não podia mentir, uma vez que seria desonesto com o trabalho da autora, e contou a verdade”, declara Lucianita.
Homenagens e exposição no Museu Histórico Nacional
Por toda a importância que tiveram na moda brasileira, Mena e Cândida ganharam o título de Beneméritas do Rio de Janeiro, outorgado pela Assembléia Legislativa e o prêmio Multimoda, conferido pela Multifabril. Mena ainda foi eleita Mulher do Ano da Moda, pelo Conselho Nacional de Mulheres do Brasil, o que resultou em seu ingresso na Academia Brasileira de Moda, conferido pelo Instituto Zuzu Angel.
Em 1996, no Rio de Janeiro, foi realizada, no Museu Histórico Nacional, a exposição Mena Fiala – Um Nome da História da Moda, onde o público pôde comprovar o trabalho minucioso de Mena e Cândida e assistir, em vídeo, desfiles da Casa Canadá.
Cinco anos depois, no dia nove de janeiro de 2001 a moda ficaria órfã de Mena.
Em 2002, o acervo de indumentária do Museu Histórico Nacional, agora sob a curadoria da museóloga e estilista Vera Lima, no Rio de Janeiro, recebe a preciosa doação de Lucianita Carvalho, filha de D. Mena: um vestido de noiva Cândida & Mena Fiala que será mostrado na exposição “E por falar em Moda”, em comemoração aos oitenta anos da instituição museográfica, no mês de outubro.
“Acho que minha vida foi profícua, acredito que tenha ajudar a formar profissionais de primeira ordem; estou segura de que juntamente com minha irmã Cândida, tenhamos aberto caminho para uma moda brasileira que se tem expandido em vários setores, e em várias direções.” – Mena Fiala.
Crib Tanaka, , é formada em Jornalismo, cursa Moda no Universidade Veiga de Almeida-Instituto Zuzu Angel, e escreve contos de moda.
 FONTE:UOL MODA BRASIL

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